O Projeto de Lei 724/24 propõe a cobrança de Imposto de Renda na fonte para todas as operações de renda variável, com o óbvio propósito de aumentar a arrecadação, além de alegar a garantia da equidade tributária.
A Receita Federal do Brasil está atenta à taxação de todos os tipos de investimentos, não se limitando apenas às criptomoedas e aos jogos de azar.
Este movimento fica evidente com a recente proposta do Projeto de Lei 724/24, que visa instituir a cobrança de Imposto de Renda na fonte para operações de renda variável na bolsa de valores e em mercados de balcão.
Proposto pelo deputado Sidney Leite (PSD-AM), o projeto está atualmente em tramitação na Câmara dos Deputados.
O que é o PL da Bolsa?
O Projeto de Lei 724/24 é uma proposta legislativa que visa instituir uma nova forma de cobrança de Imposto de Renda sobre operações de renda variável realizadas na bolsa de valores e em mercados de balcão.
O PL 724/24 introduz uma alíquota fixa de 0,075% a ser aplicada diretamente na fonte sobre todas as transações de compra e venda de ações, independentemente de lucro ou prejuízo.
O principal objetivo do PL 724/24 é aumentar a arrecadação de receita do governo federal. Ao tributar todas as operações de renda variável, o governo espera gerar uma fonte significativa de receita que será coletada de forma mais eficiente:
Atualmente, a legislação prevê uma tributação de 15% sobre os ganhos, com isenção apenas para os ganhos com ações nos meses em que o total de vendas não ultrapassar R$20 mil. A nova proposta visa simplificar o processo de arrecadação ao aplicar uma alíquota fixa e automática.
Além da arrecadação de receita, o Governo Federal alega que outro objetivo do PL 724/24 é garantir a equidade tributária. A proposta busca assegurar que todos os segmentos da sociedade, incluindo os investidores, contribuam proporcionalmente para o financiamento do estado.
A ideia é que a tributação seja mais justa e que todos os investidores paguem impostos de acordo com o volume de suas transações, independentemente dos resultados financeiros.
A regulação do mercado financeiro também é uma justificativa central para o PL 724/24. Ao tributar todas as operações, o governo pretende desincentivar a especulação excessiva e promover investimentos de longo prazo.
O governo afirma que a tributação na fonte pode ajudar a estabilizar o mercado, reduzindo a volatilidade e incentivando comportamentos de investimento mais sustentáveis e responsáveis.
Após analisar o PL 724/24, ficou claro para a equipe do Declarando Bitcoin que o único efeito prático do projeto de lei será o aumento da arrecadação do Governo. A busca pela equidade tributária é apenas uma narrativa para facilitar a sua aceitação, tanto por parte do congresso quanto da sociedade civil.
Como a nova taxação do PL da Bolsa funcionaria
Atualmente, a legislação vigente, estabelecida pela Lei 11.033 de 2004, isenta do Imposto de Renda os ganhos líquidos mensais com ações obtidas por pessoas físicas quando o somatório das vendas não ultrapassa R$ 20 mil. Ao superar esse limite, a tributação é de 15% sobre os ganhos, desde que não resultem de operações diárias (day trade), nas quais a tributação é de 20% sobre os ganhos e não há isenção de vendas.
A nova proposta, no entanto, elimina essa isenção e aplica a alíquota de 0,075% sobre todas as operações, independentemente do valor ou do resultado líquido (lucro ou prejuízo).
A principal diferença entre a nova proposta e a legislação atual é a simplificação do processo de tributação. Em vez de calcular o imposto com base nos ganhos líquidos e dentro de limites específicos, a nova alíquota é aplicada de forma uniforme a todas as transações.
Argumentos a favor e contra o PL da Bolsa
O Projeto de Lei 724/24 tem gerado um debate entre especialistas, investidores e legisladores. Aqui estão alguns dos principais argumentos a favor e contra a proposta.
Argumento a favor
Simplificação da tributação
A proposta simplifica o processo de tributação de operações de renda variável, eliminando a necessidade de calcular os ganhos líquidos e de declarar esses ganhos no Imposto de Renda anual.
A alíquota fixa e a retenção na fonte tornam o processo mais direto e menos burocrático, reduzindo a carga administrativa tanto para os investidores quanto para o governo. Essa simplificação pode facilitar o cumprimento das obrigações fiscais.
Argumentos contra
1. Potencial inconstitucionalidade
Alguns especialistas em direito tributário argumentam que a cobrança de Imposto de Renda sobre operações que resultam em prejuízo pode violar o princípio de que o IR deve incidir apenas sobre o acréscimo patrimonial.
A tributação sobre prejuízos pode ser vista como uma contradição aos fundamentos constitucionais do sistema tributário brasileiro.
2. Desincentivo ao investimento em renda variável
Investidores, especialmente aqueles que realizam muitas transações (como day traders e swing traders), podem ser desencorajados pelo aumento dos custos de transação. Isso pode levar a uma redução na atividade de mercado e a um menor apetite por investimentos em ações e outros ativos de renda variável.
3. Impacto na liquidez do mercado
Com o aumento dos custos de transação, há a possibilidade de uma diminuição no volume de negociações, o que pode reduzir a liquidez e a eficiência do mercado. A menor liquidez pode, por sua vez, aumentar a volatilidade dos preços dos ativos e assim prejudicar a estabilidade do mercado financeiro.
4. Resistência do mercado e investidores
Corretoras, gestores de fundos e investidores individuais tendem a se opor a qualquer aumento nos custos de transação. Essa resistência pode se manifestar em pressões políticas e econômicas contra a aprovação do projeto, dificultando sua implementação.
Histórico de tentativas de tributação na Bolsa
A proposta do PL 724/24 não é a primeira tentativa do governo brasileiro de tributar operações em renda variável na bolsa de valores. Ao longo dos anos, várias iniciativas semelhantes foram apresentadas, e todas enfrentaram uma série de desafios administrativos, políticos e econômicos.
Um exemplo notável é a proposta de 2014, conhecida popularmente como "Imposto da Bolsa". Este projeto de lei sugeria a cobrança de Imposto de Renda sobre operações de renda variável, de maneira semelhante ao que é proposto no PL 724/24.
O texto foi aprovado pela Câmara dos Deputados, mas encontrou resistência no Senado e foi eventualmente rejeitado em 2015. A proposta foi revisitada em 2016 com algumas alterações, mas novamente não conseguiu avançar.
Comparação com a tributação de mercados internacionais
Para entender melhor as implicações do PL 724/24 e avaliar sua viabilidade, é útil comparar a proposta com a tributação de mercados internacionais, como o dos Estados Unidos, e discutir a competitividade do mercado brasileiro em relação a esses atores globais.
Nos Estados Unidos, a tributação sobre investimentos em renda variável é significativamente diferente do que é proposto pelo PL 724/24. Lá, o Imposto de Renda é cobrado sobre os ganhos de capital e dividendos, e não diretamente sobre cada transação de compra e venda. Os ganhos de capital de longo prazo, obtidos a partir de ativos mantidos por mais de um ano, são tributados a taxas reduzidas, enquanto os ganhos de curto prazo são tributados como renda ordinária. Isso incentiva os investidores a manterem suas posições por períodos mais longos, o que promove a estabilidade do mercado.
Além disso, o sistema tributário dos EUA permite a compensação de prejuízos com ganhos, o que reduz a carga tributária total dos investidores. Esse mecanismo de compensação é fundamental para garantir que os investidores sejam tributados apenas sobre o acréscimo real de seu patrimônio, respeitando o princípio básico do Imposto de Renda.
Competitividade do mercado brasileiro
A tributação de todas as transações, independentemente do resultado, pode desincentivar o investimento em renda variável, especialmente entre pequenos investidores e aqueles que buscam oportunidades de curto prazo.
Ao mesmo tempo, o aumento dos custos de transação pode reduzir a atratividade do mercado brasileiro em comparação com outras praças financeiras globais, onde a tributação é menos onerosa e mais focada em ganhos líquidos.
A competitividade de um mercado financeiro é determinada por vários fatores, incluindo a facilidade de transação, a previsibilidade do ambiente regulatório e os custos associados ao investimento. Mercados com custos de transação mais baixos e sistemas tributários mais favoráveis tendem a atrair mais investidores, aumentar a liquidez e promover uma maior diversidade de participantes.
Se o Brasil adotar a tributação proposta pelo PL 724/24, pode haver uma migração de investidores para mercados internacionais mais competitivos, onde os custos de transação são menores e a tributação é percebida como mais justa. Isso pode resultar em uma redução da liquidez no mercado brasileiro, aumentando assim a volatilidade e dificultando a formação de preços eficientes.
O contexto do PL da Bolsa
A intenção do PL 724/24 de tributar operações em renda variável não pode ser analisada isoladamente; ela deve ser contextualizada dentro de um movimento mais amplo do Governo para intensificar a fiscalização e aumentar a arrecadação de todas as formas de investimento, incluindo criptoativos e jogos de azar.
Nos últimos anos, a Receita Federal tem demonstrado um interesse crescente em monitorar e tributar investimentos em criptoativos. Este interesse é parte de um esforço maior para fechar brechas fiscais e garantir que todas as formas de renda sejam devidamente tributadas.
No artigo Receita Federal Fecha o Cerco para Exchanges Estrangeiras e Meios de Pagamentos, Ana Paula Rabello discute as recentes ações da Receita Federal para aumentar a fiscalização sobre transações com criptoativos.
A Receita tem implementado novas regulamentações que exigem que exchanges estrangeiras e meios de pagamento reportem informações detalhadas sobre as transações realizadas por brasileiros.
Assim, o aumento da fiscalização sobre criptoativos, o PL 2234 dos jogos de azar e o PL da Bolsa são reflexos de um esforço coordenado do Governo para ampliar a base tributária.
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